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Ratinha Rosemeire Sorriso Timbal

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Ainda em solo carioca, com meus 20 e poucos anos, vi uma mulher  tocando timbal pela 1ª vez. Mais do que a letra certeira de “Xibom Bombom”, perceber a alegria de Ratinha no palco era muito contagiante!

            Anos depois, eis que vejo aquele sorrisão feminino do timbal tocando com Denny, ao lado de Élton e Nagô. Que trio sensacional! O problema é que sempre tem aquela dúvida: a gente fica quietinho olhando para eles e admirando a sincronia ou vibra loucamente?

            Na minha vidinha de fã incondicional de Axé Music e trabalhando em alguns lugares, fiz  bons amigos. Muitas pessoas em comum, mas nunca tive a oportunidade de uma conversa com ela, infelizmente.  “Éltonnn, me socorreeee! Quero muito escrever sobre a Ratinha!” Eu não poderia deixar escapar a oportunidade de contar a história dela justamente no mês das mulheres! Que doçura de pessoa, gente! Muitas mensagens, muitos áudios, muitas risadas! Até o carnaval do Rio entrou no papo. Vocês sabiam que ela foi convidada para desfilar na Viradouro ano passado? Só não foi por causa da gestação e dos compromissos profissionais aqui. A escola foi campeã com o enredo sobre as Ganhadeiras de Itapuã e Ratinha afirma que um dia vai desfilar na Marquês de Sapucaí. Eu, como boa salgueirense que sou, já torço logo para ela desfilar na escola do meu coração!

            Nossa protagonista nasceu e foi criada no Candeal. Lá no início dos anos 90, com os ensaios da Timbalada, a paixão pela percussão brotou no coração! (Tudo na pegada do “ão” mesmo).  Um pouco depois, ingressou na banda Frutos do Candeal: “As mulheres não tinham muita oportunidade de tocar, mas o coração já pulsava pela percussão. Um dia, Brown deu a chance para uma menina tocar na Timbalada. As outras tiveram coragem e ingressaram na Timbalada Arrastão. Ele foi bem visionário e montou uma banda só com mulheres, por causa da grande procura.”

            Entre 1993 e 1994, o Cacique montou a banda Bolacha Maria. Cresceu, então, a ligação de Ratinha com o Nordeste de Amaralina, já que Everaldo Águia era um dos instrutores do grupo: “Minhas grandes referências de percussão moram no Nordeste de Amaralina. Basicamente, era a galera que formava a Vai que Vem. Marivaldo também é um querido pra mim, esteve no último show da Trietá. Gosto muito dele e do Quabales. Minha “filha” Alana, mora no Nordeste também, é multi-instrumentista e toca no grupo”.

             A musicista reforça a influência de “Brown e os seus”: “Os meninos que eram da Timbalada, na época da Vai quem Vem, acabavam sendo nossa referência. Com o tempo, eu acabei tendo a oportunidade de conhecer outras mulheres, principalmente no tempo da Bolacha Maria… Mônica Millet, Leninha Oliveira, Tamima Brasil, Jane Glaydes… Elas  tocavam com a alma e com o coração. Ninguém precisava tocar como homem!  A gente tocava bem, sim, mas como mulheres! Aí veio a Banda Didá  pra mostrar a sensualidade, a dança da mulher com o tambor, que é muito lindo de se ver! Minhas referências foram os músicos e as musicistas da percussão. Com os demais artistas, fui buscando outros pontos de referência. Eu gostava muito da postura de Ivete, a forma de cantar, a alegria dela. Ouvi muito Gilberto Gil, Caetano Veloso, Gal Costa.  Eu ainda era criança, não tinha nem 15 anos e tive a oportunidade de dividir o palco com os grandes…  Naná Vasconcelos,  D. Ivone Lara, o próprio Gilberto Gil… Vários artistas que eu só ouvia falar e me vi dividindo o palco.”

            Quem aí sabe o  motivo do apelido? “O repertório da Bolacha Maria tinha cenários diferentes. Em cada música, a gente tocava um instrumento. Eu bagunçava o palco todo! Pegava instrumento do grupo A, colocava no grupo B, misturava com o grupo C, fazia loucuras e bagunçava tudo, parecendo uma ratinha mesmo! Mas se um dia eu pudesse trocar meu nome, ao invés de Rosemeire Silva, seria Ratinha Timbal”.

            Em 1997, Cícero Menezes, que havia sido sócio de Brown, resolveu criar a banda As Meninas. Ratinha teve a oportunidade de conhecer alguns países, mas foi Portugal que mais cativou o coração da percussionista. “A gente fez umas três turnês lá… Trabalhava e  também conhecia os lugares. Os portugueses foram muito acolhedores, a música “Xibom Bombom” tocava demais. Na Angola recebemos um carinho tão grande, que eu acabei me apaixonando também. Aqui no Brasil, são inúmeras as cidades que me encantaram: São Paulo, Rio de Janeiro, Caldas Novas, Itumbiara etc.”

            Ratinha participou das bandas Levada Louca e Babado Novo, gravou com É o Tchan, Fafá de Belém, Armandinho, Dodô e Osmar, Riachão, Chiclete com Banana, Juliana Ribeiro; participou do  DVD “Copacabana” de Cláudia Leitte, fez parte da banda de Carla Cristina, estudou na Pracatum e na Funceb, tocou no projeto Aya Bass com Luedji Luna, Xênia França e Larissa Luz… Ufa! Vocês acham que foi pouco? Ela ainda se formou em Administração de Empresas e trabalha regularmente num hospital: “Por isso já tomei a 1ª dose da vacina. Espero que logo todos possam tomar para que a gente veja como o vírus vai se comportar. Com fé em Deus, virão coisas boas por aí!”

@edermotaphoto

            Atualmente, toca com Larissa Luz e Denny Denan: “Quando Denny saiu da Timbalada, falou com Élton que queria que eu tocasse com ele. Ele já tinha me falado em algumas oportunidades que me queria na banda. Sempre achei que fosse brincadeira! Na minha cabeça, se ele quisesse mesmo, me convidaria e eu iria. Só que não era bem assim… Tinha uma hierarquia, os donos, diretores, enfim. Quando Élton me chamou, eu nem quis saber de maiores detalhes, já topei de primeira. Foi muito gratificante, um engrandecimento muito forte pra minha construção enquanto musicista e timbaleira. Quando a gente está de fora, não tem noção da grandeza dos batuques, dos detalhes. Lembro que, quando cheguei  no  primeiro ensaio, achei que sabia fazer as convenções… Mas percebi que fazia totalmente errado! Não é da forma que a gente ouve e executa. Élton foi essencial na minha fase de aprendizado e de aprofundamento do conhecimento dos ritmos da Timbalada. O coração já pulsava, então acabou ficando um pouco mais fácil também. Tinha muito amor envolvido! Infelizmente, com a pandemia, tem mais de 1 ano que a gente não sente o calor do público que gosta tanto do nosso tambor e da nossa música na DD Band. Mas com certeza e com fé em Deus, em breve, a gente vai aglomerar novamente, juntar os tambores e fazer a alegria não só de quem gosta da nossa música, como a nossa também!”

            Ratinha está super envolvida com o projeto Trietá, formado por ela e suas amigas Leninha Oliveira e Daniela Penna (que é do Nordeste de Amaralina): “Levamos para o palco um pouco da nossa história, enquanto amigas, musicistas, mulheres, guerreiras, perseverantes e incentivadoras… Para que um número maior de meninas se interesse pela música, o projeto conta a história da nossa vida através do tambor.”

            Machismo na música? Sim, temos! Nossa diva já foi desrespeitada muitas vezes: “Preconceito sempre teve. Já ouvi dizer que não era eu que estava tocando e que era a Timbalada… Eu achava ótimo, né? Porque ser comparada com a Timbalada era bom demais! Mas uma vez estava no palco com Deise passando o som, afinando os instrumentos e um diretor do evento veio perguntar onde estavam os percussionistas. Respondemos “somos nós”. Depois ele veio se desculpar, dizendo que nunca tinha visto uma perfeição tão grande. Que profundo, viu?! Disse que nunca tinha visto uma mulher tocando percussão. E se viu, provavelmente, nunca prestou atenção! Infelizmente, são poucas as mulheres que estão no cenário musical. Ou melhor, são poucas, mas em relação há 20 anos, são muitas.” Ela opta pelo jogo de cintura, “sem deixar a peteca cair”. Prefere buscar a união até que o cenário mude e mais mulheres apareçam tocando em todos os segmentos: “Eu tento levar da melhor forma possível, com educação. Independente de ser mulher, o desrespeito não é legal. Nem de homem para mulher, nem de mulher para homem, nem de branco para preto, nem de preto para branco. Nós precisamos respeitar o próximo para que as coisas melhorem no mundo. O respeito é uma fonte de amor, é onde tudo começa, vem de casa. Hoje, minha relação com colegas de trabalho é de família. A gente se dá bem, tem mais afinidades com uns, tem discussões também, mas todo mundo se ajuda porque o trabalho precisa fluir com boa energia, respeito e alegria, que é o que a gente quer passar para o público.”

            Ratinha não esquece a situação do entretenimento com a pandemia: “A pior coisa é não poder fazer o que a gente ama e é preparado para fazer: tocar, estar no palco, com os fãs, viajar pelo Brasil afora. Isso faz muita falta. Mas com fé em Deus vai passar. Não posso deixar de agradecer o nascimento do meu filho no meio disso tudo. Se eu estivesse com a vida normal, fazendo shows, eu estaria menos com ele. Estou tendo a oportunidade de acompanhá-lo de pertinho. Como estou cumprindo o isolamento social, só saio de casa para trabalhar. Família é a base de tudo. É sangue, coração, aconchego, é estender a mão, é amor, é brigar e sorrir ao mesmo tempo. Família é a base da nossa personalidade, do que seremos e do que fomos… Nossos antepassados.”

            Quando era criança, frequentava a Igreja Católica com a avó. Depois, passou a frequentar o Candomblé com a tia: “Qualquer coisa que aconteça na minha vida, de positivo ou negativo, eu agradeço a Deus pela oportunidade de estar vivenciando. Acredito, de verdade, que as coisas só acontecem quando Deus quer. No meu coração predomina a fé em Deus, a esperança, o amor. Existem muitas pessoas boas nesse mundo e o bem precisa prevalecer acima de tudo”.

            Ano retrasado, com o incentivo de Leninha Oliveira, Ratinha convidou Élton para formarem uma oficina de percussão. A turma bombou! “Foi bem aceito e muito gratificante. Na verdade, realizei o sonho de ensinar o conhecimento que adquiri nesses mais de 20 anos com a música. Infelizmente, por conta da pandemia, a gente teve que parar. Mas é um projeto que está muito vivo dentro de mim e vai ter continuidade quando tudo se encaixar, quando a gente entender como vai ser a nova realidade”. 

            Já estou pensando aqui em me candidatar! Será que eles podem operar um milagre em mim?! Vontade eu tenho! Só falta a coordenação motora, o ritmo, a malemolência, a baianidade…kkk! Resumindo… Falta tudo!

            Mulherada… Bora dominar o mundo!

Fayga Cabral
Fayga Cabral
Carioca, torcedora do Flamengo e do Bahia, vivendo em Salvador desde 2013. Analista de Redes em Mídias Sociais, Bacharela em Relações Internacionais. Depois que quarentou, resolveu ser estudante de História e de Letras. Ninguém é obrigado a ter um só caminho, uma só direção, uma só opinião.

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