influência, dentre eles Marieli, professora de inglês do ensino médio regular e EJA. Filha de mãe costureira, queria ser médica quando criança por influência da mãe, mas as circunstâncias apontaram que seu futuro seria brilhante como educadora: ” Eu era muito boa aluna, e quando meus primos e amigos iam em casa eu gostava de brincar de professora. Quando meus irmãos tinham alguma dificuldade nas tarefas de casa, eu sempre tinha disposição para ajuda-los com tudo o que eu sabia. Eu não seria feliz fazendo outra coisa”, lembra.
Marieli leciona em salas de aula há mais de 20 anos, entrou no Polivalente como estagiária e se tornou concursada há cerca de 17 anos. Sempre teve o apoio da mãe que foi fundamental para construir sua carreira. “Hoje em dia, ouvimos o jovem falar que vai fazer faculdade e vemos isso com muita naturalidade. Na minha época era mais difícil, as condições de ensino eram diferentes, fazer faculdade era como se fosse um sonho impossível. Hoje com o sistema de cotas se tornou mais fácil, a universidade não é mais uma realidade distante da nossa. Minha mãe, mesmo sendo mãe solteira, sempre incentivou os filhos a estudar. Hoje, todos os meus irmãos são formados ”, conta.
Mas para ser quem é hoje, foi preciso muito esforço e dedicação aos estudos: ”Eu tinha uma vizinha costureira, e a filha da patroa dela passou no vestibular, e ela perguntou se eu queria os módulos do cursinho que ela fazia, eu aceitei e comecei a estudar sozinha. Quando eu ia trabalhar, eu observava no ônibus quem estudava nesse cursinho e qual a cor do módulo que eles estavam usando, quando eles mudavam de cor eu entendia que precisava acelerar pois eles já estavam mais avançados que eu. Tudo dependia do esforço individual, o que é um erro, deveria existir políticas públicas que incentive todos os jovens a estudar, que ofereça oportunidades para todos igualmente. Nossos jovens são talentosos, e muitas vezes não tem quem observe esses talentos. Quando eu estou em sala de aula, tento fazer com que todos os meus alunos vejam como são capazes de chegar onde quiserem.”
A maior dificuldade que enfrenta dentro da sala de aula, não é em relação a didática e sim a construção do senso de capacidade que ela tenta construir em seus alunos: ” Eles não enxergam o potencial que eles tem, eu tento fazer com que eles vejam o quão brilhantes eles são. O sistema social já não favorece que nós tenhamos esse alcance a educação, então é comum que alguns alunos se achem inferiores só por serem ruins em matemática por exemplo, mas não conseguem enxergar que são ótimos em algum tipo de arte e isso também é sinônimo de inteligência e talento”.
Em toda a sua trajetória na educação, a educadora consegue ser em sala de aula muito mais do que uma professora. Sempre esteve presente na vida de seus alunos abrindo espaço para o diálogo, levando conhecimentos que vão além da disciplina lecionada, e reforçando sempre o direito de escolha de cada um. ”Não há nada de errado em não escolher fazer faculdade. Tudo bem optar por um curso técnico ou um trabalho por exemplo. O mais importante é que eles possam ter o direito de escolher aquilo que querem fazer. Não nos tornamos pessoas bem sucedidas apenas fazendo faculdade. Todos somos brilhantes a nossa maneira. E não podemos achar que só porque moramos no Nordeste e estudamos em escola pública não podemos fazer uma faculdade. Precisamos ocupar esses espaços porque eles nos pertencem também. Não posso enterrar o talento dos meus alunos”, explica.
Por ser mulher negra, a docente também já teve que lidar com situações de racismo, como ela mesmo conta: ”Já trabalhei em lugares onde eu exercia minha função da melhor forma possível, era a única com doutorado, ganhava menos que todo mundo, e acabei sendo demitida. Outra pessoa com conhecidos na empresa ocupou minha vaga, se quer tinha especialização ou formação na área, e ganhava mais do que eu. O discurso da meritocracia não funciona, porque aquele que se esforça e consegue chegar lá é reconhecido, mas precisamos pensar naqueles que nem chegaram a ter oportunidade. Gosto sempre de falar para os meus alunos que eu não sou um modelo a seguir, eu sou um exemplo de que é possível chegar lá, mesmo com tantas dificuldades em nosso caminho ”.
”Eu me acho uma pessoa muito consciente e preocupada com o outro, quando eu era adolescente eu já me sentia assim e as pessoas me achavam frágil, mas eu sempre me achei forte. Ser professora no Nordeste de Amaralina é você acreditar que é uma potência e pode fazer com que os outros vejam que eles também são. Eu amo o Nordeste de Amaralina, foi o lugar onde eu dei fruto, onde eu me construí. Ser professora negra no Nordeste de Amaralina, sendo fruto desse bairro é um ato político. Eu sempre me senti bem aqui, e poderia ficar aqui para sempre ”, finaliza.