Em 2004 foi criado pela então Secretaria do Trabalho, Ação Social e Esporte (SETRAS), o programa “ Viva Nordeste”. O programa visava melhorar a qualidade de vida da comunidade do Nordeste de Amaralina e adjacências através de políticas básicas de inclusão social. Três anos depois, em 2007, o Viva Nordeste passou a se chamar CSU (Centro Social Urbano) sob a administração da SEDES, Secretaria de Desenvolvimento Social e Combate à Pobreza. O centro oferece serviços de empresas, órgãos e entidades como Banco Comunitário, Balcão de Justiça e Cidadania, Infocentro Digital, Infocentro Musical, Bibliotecas e cursos diversos, como de artesanato, receptivo afro e balé. A última reforma ocorrida na unidade foi em 2010. Na ocasião o centro foi totalmente reformado, teve suas instalações reparadas e seu Parque Esportivo ampliado, com a instalação, inclusive, de uma piscina semi-olímpica, a única piscina pública comunitária em bairro popular da Bahia. O investimento do governo na reforma foi de R$ 490 mil. Em 2011 foi instalada a Base Comunitária de Segurança dentro do Centro Social Urbano do Nordeste (CSU) o que gerou muitas críticas por parte da comunidade. Em entrevista ao Nordesteusou (NES), a gestora da unidade, a assistente social e bacharelando em Direito, Andreia Macedo, nos falou sobre os problemas à frente da unidade, sobre os projetos e realizações e da relação do CSU com a comunidade.
NES – Há quanto tempo você está a frente do CSU?
Andreia Macedo – Cheguei aqui em agosto de 2010. Na verdade, vim somente para ficar alguns meses, por conta de alguns problemas que existiam aqui na unidade. Acabei ficando porque gostei, porque me afeiçoei a comunidade. Além disso, o governo do estado percebeu que houve resultados efetivos.
Quais os principais problemas ou entraves que você enfrentou à frente da CSU?
Em relação ao contexto social acho que é aquela velha questão da misoginia . Ainda existe uma resistência muito grande por parte de mulheres à frente de alguma unidade, especialmente em unidades de maior visibilidade. Mas acredito que isso seja um desafio, pois é preciso mostra que uma mulher negra e oriunda de bairro periférico está à frente de um espaço estadual. Outra questão é a gente saber a diferença entre líder comunitário e servidor público. Eu sou as duas coisas. São dilemas que vivemos diariamente, mas que a gente consegue dissipar com o apoio de diversos parceiros.
Não sou moradora do bairro, mas sou domiciliada aqui.
Já existiu alguma situação emblemática em que você sofreu alguma discriminação por ser mulher e negra?
Quando eu cheguei aqui no CSU/Nordeste, que era gerenciado por um homem, senti que alguns homens da comunidade foram resistentes à minha presença aqui. Diziam que para esse cargo deveria ser alguém do sexo masculino… Com pulso firme… Várias mulheres me disseram que não encontravam aqui ambiente para os sexo feminino. Fizemos então projetos que trouxessem essas mulheres aqui para a unidade. Hoje temos um grupo grande de mulheres aqui. Professoras, coordenadoras…
Nesse período quais foram as suas principais realizações à frente do CSU?
São inúmeras… Do ponto de vista pessoal, o Nordeste de Amaralina me regozijar, me fortalece no sentido mesmo de ser negra e mulher atuante em comunidade. Já tenho 17 anos de formação em serviço social e sempre trabalhei em comunidade, mas aqui é diferente. Aqui você acaba se envolvendo emocionalmente a ponto de não permitir que ninguém fale do Nordeste lá fora. Aqui no CSU, conseguimos o retorno da Universidade para Todos, conseguimos a questão da hidroginástica e da natação, conseguimos o aumento no número de crianças nas atividades da Funceb (hoje já são 3 turmas), a Neojibá, o Grupo Reviver, cursos de qualificação, ampliação das atividades no infocentro digital, o projeto Rainha Nzinga, projetos da consciência negra, o outubro rosa, o projeto Olodum… Temos os professores e parceiros aqui do bairro que nos buscam para dar garantia de um espaço para eles fazerem às suas atividades, como a professora Gisele, o professor Junior e o professor Paulo do “Mar Aberto”. Temos o projeto de uma pista de skate e próprio o xadrez, que tem nos dado muito orgulho. Temos ainda o projeto Vida Melhor que beneficia empreendedores aqui da comunidade. Estamos batalhando para a implantação do Núcleo de Direitos Humanos que irá atender vítimas de situação de violência urbana, doméstica e etc. O trabalho continua e cada vez mais temos percebido que as pessoas nos buscam para fazer parcerias.
Em sua opinião, quais seriam as principais mudanças do Viva Nordeste para o CSU?
Diante de tanta inquietação por parte da comunidade e da importância do projeto para a mesma eu fui buscar informações a respeito do Viva Nordeste. Entretanto, o Governo do Estado não pretende retomar o projeto Viva Nordeste. Pelo menos foi o que nos disseram nas interlocuções com os próprios secretários. A diferença é que o Viva Nordeste, pelo que nos esclareceram, tinha núcleos para trabalhar in loco com a comunidade e justamente fazer provimento dessas ações. Era como se fossem pequenas coordenações que iam na comunidade e onde se podia trabalhar diretamente com aqueles grupos específicos. O Centro Social Urbano é uma casa de serviços. Não temos técnicos para ir até as casas. Oferecemos os serviços e trazemos a comunidade para o organismo. O que fazemos além da nossa função é justamente estabelecer parcerias com outras instituições que tenham uma semelhança com o que era construído para que a gente possa tentar sanar situações de conflito na comunidade. As pessoas que estavam aqui antes de mim disseram que uma das diferenças é que hoje temos um corpo de funcionários reduzido. Temos apenas 10 funcionários…. Não temos os técnicos que ficavam responsáveis pelos projetos como no Viva Nordeste. Se tivesse essa possibilidade eu adoraria.
Como foi a questão da implantação da Base Comunitária de Segurança aqui no CSU?
A base comunitária, assim como outros serviços que aqui estão alocados, tem que funcionar do ponto de vista das atividades sociais aqui desenvolvidas. Obviamente que se eles forem fazer qualquer outra atividade aqui dentro precisamos nos reportar. Entretanto, não temos gerência em relação ao contexto militar. Fiquei sabendo da implantação através do nosso coordenador geral. A minha função aqui não foi de autorizar ou desautorizar. Minha função foi de tentar dirimir os conflitos internos, gerenciar o que estava por vir e esperar o que a comunidade poderia resolver junto com o governo.
Muitas são as críticas sobre a implantação da base. A principal delas diz que a presença da polícia acabou por afastar a comunidade do Centro Social Urbano. Como você analisa essa questão?
Existem as reclamações, é claro. Tenho ciência dessas críticas. Já houve várias interlocuções aqui a respeito da presença da polícia aqui no CSU. Tenho aqui o atendimento mensal de mais de 5 mil pessoas, inclusive da polícia. Não sei basicamente quem são as pessoas…. Quem é que se afastou…. Sei que continuo mantendo aqui o meu operacional e o número de pessoas que eu atendo tem crescido. A polícia veio, mas nós também conseguimos outros serviços… Entretanto, não tenho como mensurar essa evasão.
Após a implantação da base de segurança, de que forma as incursões da polícia lá fora influenciam aqui dentro?
Quando existe alguma situação que a gente perceba que é de risco temos que suspender as atividades. Até então não chegou ninguém a mim contando alguma situação que deixou de frequentar o local porque é “envolvido” ou tem algum parente “envolvido”. O posto de saúde, certa vez, quis se instalar dentro da base de segurança. Isso me chamou à atenção. Algumas mães disseram assim: “Vai instalar dentro base? E se os “meninos” quiserem vir vacinar os filhos? Será que terão coragem de vacinar aqui dentro?”. Então fui ao embate, pois todo mundo tem direito de tomar vacina. A questão da saúde é direito de todos, independentemente se tenha alguma questão com a polícia ou não.
Como você avalia o diálogo entre o CSU e a comunidade?
Fazemos o possível. O resultado está aí. Qualquer evento que realizamos a comunidade está sempre presente. As lideranças são sempre parceiras e estão sempre presentes. Temos aquelas pessoas que estão aqui conosco e que podem nos dizer: “Isso aqui está bom”, “Isso aqui a gente tira”…Por exemplo: a comunidade nos solicitou e mudamos o horário da hidroginástica. Estamos aqui para ouvir e tentar mediar. Claro que tem situações que não podemos mudar, pois são de organicidade de fora. A comunidade tem nos dado um feedback bacana. A presença da comunidade aqui diariamente fortalece a premissa do CSU. A própria comunidade pode falar por nós. Dizem que quando você é bom, você mesmo é quem diz. Quando você é excelente, quem fala são os outros.
Como é a relação do CSU com o Beco da Cultura?
O Beco da Cultura consiste no Polivalente, o Zulmira e o Carlos Santana I e II. Nossa relação aqui é muito próxima com todos. Sempre estamos buscando estender para as escolas as atividades aqui realizadas. A escolas também nos convidam.
Quais os próximos projetos da unidade?
Como já havia dito, estamos com a possibilidade da instalação do Núcleo de Direitos Humanos. Temos também um novo projeto para trabalhar com os empreendedores. O curso de bombeiro civil. Temos a possibilidade de estar implantando um curso de cuidador de idosos.
O CSU apresenta problemas estruturais. Existe alguma sinalização do Governo do Estado quanto ao início das obras de reforma da unidade?
Sim. Já foi autorizado pelo secretário anterior, e inclusive já foi falado em reunião aqui com a comunidade. Estamos esperando a liberação das verbas. Pediram que a gente aguardasse até dezembro para nos dar alguma informação. A última reforma aconteceu em 2010… Acredito que logo em breve teremos boas notícias. Todos os dias cobro isso. Inclusive, hoje, já começamos a reforma do toldo. Queremos ter um espaço melhor onde possamos estar alocando mais pessoas.
Qual mensagem que você deixaria para a comunidade?
Gostaria muito de continuar contando com o apoio dos parceiros amigos. Não estamos pedindo que goste da pessoa Andréia, mas que veja pelo bairro. É muito fácil ser pedra e muito difícil ser vidraça. Geralmente que está à frente de um serviço é rechaçado …. É criticado… Mas quantas são as pessoas que realmente se colocam a disposição para ajudar? Ser líder e ser militante é muito mais do que você atacar as pessoas.