O novo coronavírus não afeta a todas as pessoas igualmente. Quem é idoso e já sofre de outras doenças, por exemplo, têm um risco maior de vir a falecer pela doença que o vírus causa, chamada de Covid-19. Também é possível que pertencer ao sexo masculino também eleve esse risco.
Por razões médicas e de saúde pública, os pesquisadores buscam descobrir quais os grupos que têm mais risco de infecção, e quem são as pessoas com maior chance de desenvolver doenças graves ou até letais. A partir dessa informação, pode-se estimar quem deve ser tratado de forma mais agressiva, os governos conseguem uma idéia melhor de quais medidas a serem tomadas e todos saberiam se é preciso tomar precauções adicionais especiais.
Aqui está o que a pesquisa mostrou após três meses de surto.
VELHOS E JOVENS
A grande maioria dos casos na China – 87% – ocorreu em pessoas de 30 a 79 anos, informou o Centro Chinês de Controle de Doenças no mês passado, com base em dados de 72.314 pessoas diagnosticadas com Covid-19 em 11 de fevereiro. Isso provavelmente está mais ligado à biologia do que a elementos do cotidiano das pessoas infectadas, como, por exemplo, estar frequentemente em contato com outras pessoas. Adolescentes e pessoas na casa dos 20 anos também estão em contato com muitas pessoas na escola, no trabalho e no transporte público, mas não parecem contrair a doença a taxas significativas: apenas 8,1% dos casos tinham idades na casa dos 20 e poucos anos, 1,2% eram adolescentes, e 0,9% tinham 9 anos ou menos. A missão da Organização Mundial da Saúde na China descobriu que 78% dos casos relatados em 20 de fevereiro ocorreram em pessoas com idades entre 30 e 69 anos.
O número de mortos mostra ainda mais diferenças no quesito idade. No geral, o CDC da China constatou que 2,3% dos casos confirmados morreram. Mas a taxa de mortalidade foi de 14,8% em pessoas com 80 anos ou mais, provavelmente refletindo a presença de outras doenças, um sistema imunológico mais fraco ou simplesmente uma saúde pior. Por outro lado, a taxa de mortalidade foi de 1,3% em 50 e poucos anos, 0,4% em 40 e poucos e 0,2% em pessoas de 10 a 39 anos.
O risco de morte relacionado à idade provavelmente reflete a força ou fraqueza do sistema respiratório. Segundo pesquisadores, cerca de metade dos 109 pacientes da Covid-19 (idades entre 22 e 94) tratados no Hospital Central de Wuhan desenvolveram a síndrome do desconforto respiratório agudo (SDRA), na qual o fluido se acumula nos pequenos sacos de ar dos pulmões. Isso restringe a quantidade de ar que os pulmões podem absorver, reduzindo o suprimento de oxigênio aos órgãos vitais, às vezes fatalmente; metade dos pacientes com SDRA morreu, em comparação com 9% dos pacientes que não desenvolveram a síndrome.
Uma explicação intrigante para a aparente resiliência da juventude: em regiões próximas à província de Hubei, as crianças pequenas parecem ter estado especialmente expostas a outros coronavírus, relataram cientistas da China em 2018. Isso pode ter lhes dado pelo menos imunidade parcial a essa variedade do vírus.
HOMENS E MULHERES
O efeito do sexo na suscetibilidade ao Covid-19 é menos claro que o efeito da idade, mas dados preliminares sugerem que os homens podem ser mais suscetíveis. O CDC da China descobriu a proporção de infectados foi de 106 homens para cada 100 mulheres, enquanto a missão da OMS verificou que os homens representam 51% dos casos. Um estudo com 1.099 pacientes Covid-19 em Wuhan até 29 de janeiro encontrou um desequilíbrio maior: 58% eram do sexo masculino, informou o Grupo de Especialistas em Tratamento Médico da China para Covid-19 na semana passada no New England Journal of Medicine.
É possível que o aparente desequilíbrio entre os sexos seja o reflexo de padrões de viagens e de contatos que aumentem a probabilidade de homens serem expostos a portadores do vírus, e não a diferenças biológicas inerentes. Também é possível que a aparente pior gravidade da doença nos homens possa distorcer os dados. Entre os pacientes hospitalizados, “há uma ligeira predominância de homens”, escreveram pesquisadores dos EUA na semana passada no JAMA. Se o vírus atingir os homens com mais força do que as mulheres, os sistemas de saúde verão, testarão e contarão mais homens.
Para determinar se há diferenças entre os sexos na suscetibilidade à infecção, seria necessário um experimento antiético: expor 1.000 homens e mulheres semelhantes ao vírus e ver quem fica doente.
As taxas de fatalidade, no entanto, são reais: 1,7% para mulheres e 2,8% para homens, informou o China CDC.
DOENTE OU SAUDÁVEL
A diferença entre homens e mulheres nas taxas de mortalidade e, talvez, na incidência relatada, pode surgir de diferenças na saúde geral das pessoas. Pessoas com doenças pré-existentes são mais propensas a ficar gravemente doentes com Covid-19, e os homens têm uma incidência maior de doenças crônicas como doenças cardiovasculares.
No primeiro grande estudo sobre o efeito das doenças pré-existentes, pesquisadores na China analisaram 1.590 pacientes de todo o país com doenças confirmadas em laboratório. Eles calcularam como as “comorbidades” – as doenças já existentes – afetavam o risco de que o paciente fosse admitido numa UTI, colocado em um ventilador ou vir a morrer.
Depois de levar em consideração a idade dos pacientes e o tabagismo, os pesquisadores descobriram que os 399 pacientes com pelo menos uma doença adicional (incluindo doenças cardiovasculares, diabetes, hepatite B, doença pulmonar obstrutiva crônica, doenças renais crônicas e câncer) tiveram uma chance 79 % maior de exigir cuidados intensivos, um respirador ou ambos, ou morrer. Os dados foram relatados na semana passada em um artigo publicado no medRxiv, um site de pré-impressão que publica pesquisas antes de serem revisadas por pares. Os 130 indivíduos com duas ou mais doenças adicionais tiveram 2,5 vezes o risco de qualquer um desses resultados.
Isso coincide com o que se sabe sobre outros vírus respiratórios. Pessoas com uma única co-morbidade que contraem a gripe aviária (H7N9) têm 3,4 vezes mais chancesde exigirem ventiladores e outros cuidados intensivos do que pacientes com gripe apenas. A SARS e a MERS, que também são causadas por coronavírus, também são mais graves em pacientes com doenças subjacentes.
Ao analisarem o risco do Covid-19 junto com as comorbidades mais comuns, os cientistas descobriram que o câncer aumenta o risco em 3,5 vezes, a DPOC em 2,6 vezes e o diabetes e hipertensão em cerca de 60%. Como não é incomum alguém ter uma doença pré-existente (especialmente diabetes e hipertensão) sem saber, o último número provavelmente é subestimado.
As comorbidades também aumentam o risco de morte por Covid-19. A análise, pelas autoridades de saúde da China, de 44.672 pacientes, constatou que a taxa de mortalidade em pacientes que não relataram outras condições de saúde foi de 0,9%. Já naqueles com doença cardiovascular foi de 10,5%, 7,3% para aqueles com diabetes, 6,3% para pessoas com doenças respiratórias crônicas como DPOC, 6,0% para pessoas com hipertensão e 5,6% para pessoas com câncer.
As doenças subjacentes podem mudar o curso do Covid-19. Durante o auge da epidemia em Wuhan, 37 de 230 pacientes em diálise por insuficiência renal no Hospital Remnin desenvolveram a doença. Embora nenhum estivesse doente o suficiente para exigir cuidados intensivos ou um ventilador mecânico, seis deles morreram, registrando-se uma alta taxa de mortalidade de 16%. Estranhamente, no entanto, nenhum dos seis morreu de pneumonia, relataram os pesquisadores de Remnin. Em vez disso, as causas da morte foram doenças cardíacas, derrames e altos níveis de potássio no sangue (resultado de insuficiência renal). A alta taxa de mortalidade do Covid-19 em pessoas já doentes pode resultar não do vírus, mas de uma exacerbação da doença existente.
GRAVIDEZ
No início de fevereiro, a mídia estatal chinesa informou que uma mulher infectada pelo vírus deu à luz um bebê que mais tarde deu positivo. Os recém-nascidos podem ser infectados por causa da proximidade de um paciente, como qualquer outra pessoa, mas o caso suscitou temores de que uma mulher grávida possa transmitir o vírus ao feto através da placenta.
Apenas um pequeno estudo investigou essa “transmissão vertical”. Cientistas da Universidade de Wuhan descobriram que, das nove pacientes grávidas infectadas com o vírus (todas tiveram cesariana) no terceiro trimestre, nenhuma parecia transmitir o vírus aos bebês, que atingiram o topo da escala Apgar de recém-nascidos. saúde.
Quanto às mães, “o Covid-19 parece não ser especialmente grave em mulheres grávidas, pelo menos com base no pequeno número deste estudo”, escreveram os cientistas. Isso foi algo surpreendente porque a gravidez suprime o sistema imunológico (para não atacar o feto); mulheres grávidas são mais suscetíveis a patógenos respiratórios do que mulheres não grávidas. No entanto, nenhuma das nove mulheres desenvolveu pneumonia grave por Covid-19.
Sharon Beagley