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Neste domingo, acontece a 7ª caminhada do Povo de Santo do Nordeste de Amaralina

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É nesse domingo, 07 de julho, às 8h, com saída do final de linha, a 7ª edição da Caminhada do Povo de Santo do Nordeste de Amaralina. O evento tem como tema central a luta pela preservação dos espaços sagrados. O cortejo percorre as ruas do bairro e culmina com a entrega do presente na praia de Amaralina. Estarão presentes representantes dos terreiros do bairro e de outras localidades. Como já é tradição, o comando da festa fica por conta do Afoxé Bamboxé.

De acordo com Rodrigo Coelho, um dos membros da coordenação do encontro, a ideia da caminhada surgiu da necessidade de demonstrar o papel das religiões de matriz africana dentro do Nordeste de Amaralina e mostrar a cultura que é o candomblé, que para ele vai muito além de uma religião.  “É uma cultura que representa toda história de um povo.  A intenção é conseguir cada vez mais reunir o maior número de terreiros do Nordeste para que possamos fazer um evento cada vez maior e mais bonito”, explica Rodrigo. Coelho ressalta também que a receptividade por parte da comunidade tem sido cada vez maior. Essa ano, inclusive, a organização do evento disponibilizará condução para que adeptos de outros bairros possam vir prestigiar a caminhada aqui do Nordeste. “A cada ano estamos incrementando a forma de organizar a caminhada para que possamos agregar o maior número de terreiros. A ideia é mostrar o candomblé para além do Nordeste. Sairá condução de Cajazeiras, Cidade Baixa e Lauro de Freitas. O objetivo é manter a história e tradição do nosso povo cada vez mais viva”, salienta. Questionado sobre apoio do poder à empreitada da comunidade de santo, Rodrigo é enfático:  “Nós recebemos do Governo do Estado apoio para a estrutura da caminhada. O trio que conduzirá a caminhada foi cedido pela Secult (Secretaria de Cultura), da Embasa e da Cese (Coordenadoria Ecumênica de Serviço) que nos ajuda com apoio financeiro. Também temos que ressaltar o apoio do Nordesteusou”.

A CAMINHADA – A primeira edição da Caminhada do Povo de Santo do Nordeste de Amaralina ocorreu em 2011. Almir Odun Ará, vocalista do Bamboxé e um dos principais articuladores da primeira edição do evento, explica que certamente já existia no imaginário das pessoas, sobretudo, dos mais velhos a idéia de se realizar algo nesse sentido, mas que a inciativa, de fato, partiu do babalorixá João Luis e do próprio Bamboxé. “Havia uma discussão, na ocasião da formação do Afoxé Bamboxé, sobre essa questão da unidade no candomblé, da desunião… Mas efetivamente, eu me lembro, que foi o babalorixá João Luis quem levantou essa tese que deveriamos organizar uma caminhada levando todo mundo. Reunimos o povo, fomos aos terreiros e colocamos na rua. Montamos a primeira caminhada do povo de santo com o título Gangazumba. A organização contou com a participação do Bamboxê, do Nordesteusou e dentre outras pessoas que também abraçaram a idéia. Fomos para cima e colocamos todos os pais e mães de santo na rua. Fizemos uma caminhada grande, bonita. Isso foi um marco nunca feito que é colocar o povo de matriz africana na rua”, lembra Almir.

Rosiclei Santana Nascimento, mais conhecida como “Rosinha de Omolu” ou “Mãe Rosinha”, é a ialorixá responsável pela parte litúrgica da caminhada. A iyá destaca a união como um dos pontos mais importantes do encontro. Outra questão levantada por ela diz respeito à necessidade do povo de santo se reafirmar perante à sociedade: “A importância da caminhada é de unir o povo do axé do Nordeste, além de mostrar para toda a comunidade a nossa religião e a nossa cultura. Que nos respeitem mais… Teremos que lutar muito para vencer essa batalha”.

Tradicional participante da caminhada, desde à primeira edição, Rosimeire Alves ou “Mãe Rose de Nanã” do Ilê Axé Yá Dê é nascida e criada na Vasco da Gama, local onde também é situado o terreiro. Entretanto, seus laços com o Nordeste de Amaralina são de longa data. Sua mãe biológica, a ialorixá Gildete de Oxum era filha de santo de um antigo e conhecido babalorixá do bairro: Dofono de Ogum. Por sua vez, sua mãe de santo, Neuza de Ogum, hoje no Rio de Janeiro, também era do Nordeste, da mesma forma filha de Dofono, além de ser a ialorixá responsável pela “feitura” do santo de um dos idealizadores, se não o maior, da caminhada: Pai João Luis.

Rosimeire frequentou alguns terreiros do bairro, tais como: o do próprio João Luis (seu irmão de santo), de Mãe Sílvia (já falecida) e de Mãe Dulce (também já falecida), de Pai José Maria e de Mãe Juraci. “Fiquei sabendo da caminhada através da Ebomi Lia de Oxum (filha de santo de José Maria e irmã biológica de Mãe Juraci). Achei excelente. Os meninos muito comprometidos. A comunidade também muito interessada. Todo ano eu vou. Acho de fundamental importância para nossa religião, sobretudo, nos aspectos relacionados à preservação e união dentro do candomblé”, conta.

“VI Caminhada do Povo de Santo do Nordeste de Amaralina – Pela preservação dos nossos espaços sagrados”.

Nas religiões de matriz africana, os espaços sagrados transcendem aos limites dos terreiros, templos ou barracões. No culto ao orixá, ao extravasar os seus próprios muros, o povo de santo acaba por sacralizar outros espaços tais como: as encruzilhadas, as matas, cachoeiras, praias e etc. Se Ogum, o orixá ferreiro e guerreiro, tem o domínio das estradas e das ferrovias, Exu reina soberano nas encruzilhadas. Se Oxum é a rainha das águas doces, Iemanjá mostra toda sua imponência nas águas salgadas. Por sua vez, Oxossi é o senhor das matas…

Na comunidade do Nordeste de Amaralina, especificamente, esses espaços sagrados são enraizados na praia de Amaralina, no culto à iemanjá e no Parque Joventino Silva, mais conhecido como Parque da Cidade, local de grande reserva de folhas sagradas, ewé orò ou folhas de orô ogum.

É na praia de Amaralina que o povo de santo do bairro do Nordeste reverencia a rainha das águas. Na tradição da festa dos pescadores, atualmente tão esquecida e abandonada quanto a própria orla do bairro. Não por coincidência, o descaso do poder público com as demandas do bairro assemelha-se ao preconceito com a cultura do povo negro.

“Sem folha, não há orixá”, diz um provérbio africano. Em vários locais do bairro, onde ainda nos primórdios a mata nativa e as fontes de água forneceram o ambiente ideal para a instalação dos terreiros de candomblé, era fácil encontrar as mais diversas espécies de folho. Arueira, araçá-mirim, folha de bananeira (para enrolar o abará), cana-de-macaco eram achadas em fartura. No Beco da Cultura, na antiga fazenda Pituba, mais precisamente onde hoje existe o Colégio Polivalente, um pé de Iroko foi plantado com a intenção de assentar um Exú. É o que conta Dona Guilhermina, antiga moradora da região e nora de um antigo pai-de-santo da região. “Iroko é um espirito sagrado, é uma entidade. Iroko é um vento”, diz a sábia senhora.

É dever da sociedade a preservação desses lugares e o entendimento da importância deles como elementos fundamentais para o culto aos orixás. A degradação da praia de Amaralina não atinge somente aos banhistas. O descaso com o local é um corte dilacerante no seio do povo de santo da região. Em sua sétima edição a Caminhada do Povo de Santo do Nordeste de Amaralina, fazendo-se valer do seu papel de instrumento luta e resistência, se propõe a trazer para o debate a importância da preservação dos nosso espaços sagrados. Vista seu branco, enrole seu turbante, encha o seu espirito de paz e venha marchar em favor das demandas do povo de santos. Assim seja! Salve Olorum!

Caminhada do Povo de Santo do Nordeste de Amaralina

Data: 07 de julho – Saída às 8h do final de linha do Nordeste


Tiago Queiroz
Tiago Queiroz
Graduado em Comunicação/Jornalismo, e exerce as funções de Editor e Coordenador de Jornalismo do Portal NORDESTeuSOU

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